15 de dezembro de 2020 Por Eng. Felipe Jacob

Afinal, para que servem os contraventamentos?

Olá meus queridos amigos e colegas da engenharia estrutural. Aqui quem vos fala é o Eng. Felipe Jacob, e nesse artigo vou ajudar você a compreender algumas funções dos contraventamentos nas estruturas de aço.

Uma das dúvidas mais comuns entre os alunos do curso de projeto e cálculo de estruturas de aço é a respeito das funções dos contraventamentos. para que eles servem? Por que algumas estruturas são contraventadas em todas as terças e outras são contraventadas pulando algumas terças?

É isso que eu vou explicar nesse artigo, então continue lendo que você com certeza vai entender

Tipos de contraventamentos

Por uma questão didática é interessante separar os contraventamentos em dois tipos: Contraventamentos verticais e Contraventamentos Horizontais

Os contraventamentos verticais são aqueles usados entre pilares, para criar estabilidade e rigidez em pórticos planos. Isso é apenas para você saber do que estamos falando

Função 1: Melhorar a rigidez contra esforços horizontais

Essa é a função mais intuitiva dos contraventamentos. Como o nome sugere, essas peças oferecem uma resistência “contra o vento”. Não devemos entender que eles só terão efeitos contra carregamentos de vento, mas contra qualquer ação horizontal ou com componente horizontal, como cargas oriundas da aceleração e frenagem de pontes rolantes, veículos, etc. O mecanismo é bem simples: Um pórtico sem contraventamento deverá resistir às cargas horizontais contando apenas com a rigidez à flexão (EI) dos próprios pilares. Mas um pórtico contraventado adicionará ao sistema um componente com comportamento muito mais eficiente, que é a rigidez à tração (EA) de uma barra. Veja essa comparação feita no ftool

O pórtico acima foi modelado com pilares W310X21 com 5000mm de altura e vigas W250X17,9 com 4000mm de comprimento, bases rotuladas, solicitado a uma carga horizontal hipotética de 10 kN, apenas para efeitos de comparação. O deslocamento final horizontal do topo do pilar nessas condições foi de 420mm.

Adicionou-se então barras de contraventamento de diâmetro 10mm. Observe que estão modeladas apenas as barras que tracionam, uma vez que esse elemento em alguns casos pode ser considerado com comportamento de ‘cabo’, em outras palavras: se comprimir fingimos que esse elemento não existe, e o sistema é sustentado apenas pelos cabos tracionados. Considere portanto que o pórtico é formado por um X de Barras redondas diametro 10mm e que as barras que não estão representadas estão comprimidas, e por isso não estão participando do nosso cálculo.

Veja que a simples adição dessa barra redonda de diametro 10mm (3/8”) reduziu o deslocamento do topo do pilar de 420mm para 5,25mm(!!!). Isso significa um deslocamento final de 1,2% se comparado ao modelo sem contraventamento. Eliminamos 415mm de deslocamento final colocando um X de barras de 10mm

Agora para efeito de comparação, Vamos criar rigidez sem o contraventamento. Podemos mexer em duas variáveis: Vinculação das bases, e Inércia do pilar. Primeiro vamos para o mais barato, vamos engastar as bases:

Ao engastar as bases, já reduzimos o deslocamento de 420mm para 104mm (aprox. 25% do inicial, mantendo os pilares W310X21 e a viga W250X17,9)

Essa mudança de rigidez das bases em si já seria mais complexa e mais cara de se executar do que a solução contraventada. mas vamos continuar nossa comparação, vamos mexer nos pilares e vigas desse pórtico até atingirmos a performance do pórtico contraventado:

Após algumas tentativas trocando pilares, encontramos os perfis HP 250X62 e o deslocamento atingiu 4,59mm. Mas para isso foi necessário criar base engastadas e adicionar (62-21)kg x 5m x 5 pilares = 1025 kg.

Já na opção contraventada, não foi necessário tornar a base mais complexa e rígida, não foi necessário trocar de pilares, apenas adicionou-se 25,6m de barras diametro 10mm com peso final adicional de 16kg.

Me responda você: Vale a pena ou não vale?

Observe, que a análise que fiz foi puramente comparativa, analisando apenas o efeito sobre o deslocamento de um pórtico. É claro que outras verificação se fazem necessárias na etapa dos Estados Limites Últimos, mas o efeito sobre os momentos fletores é igualmente benéfico. Portanto, Contraventar tem um grande efeito sobre a rigidez da estrutura, adicionando-se pouquíssimo custo para o executor.

Mas e se meu cliente quiser colocar uma janela ali?

Se o contraventamento atrapalhar alguma janela ou porta, primeiro mostre para o seu cliente a economia que isso está gerando, e sugira mudar a janela de lugar, geralmente isso basta. Se não for possível podemos explorar algumas idéias, todas muito boas, mas nenhuma com a mesma eficiência do bom e velho X. Veja algumas composições:

O contraventamento em K, conforme a imagem acima (lembrando que apenas modelei a barra de contraventamento tracionada, considere que há uma simetria no mesmo módulo, formando um V invertido, ou um K deitado), com pilares de W310X21, viga de W250X17,9 e contraventamentos em K de barra de diametro 10mm nos gera um deslocamento final de 17,58mm, cerca de 3X maior que o os 5,5mm que tínhamos inicialmente, mas ainda assim bastante eficiente, visto que combateu um deslocamento inicial de 420mm adicionando-se apenas 14 kg ao pórtico inicial, sem enrijecer as bases.

Mas digamos que você precise de ainda mais espaço, podemos adotar essa configuração abaixo:

Essa configuração permite uma abertura maior, mas no caso acima eu aumentei a barra de uma diâmetro de 10mm para 19mm, e mesmo assim chegamos a uma flecha de 34mm no topo. Como eu disse, não é tão eficiente como o X, mas observe que conseguimos reduzir de 420mm para 34mm adicionando um peso de 65 kg apenas… nada mal, e nem chega perto dos 1025 kg que testamos sem contraventamento algum.

Função 2: Estabilização da estrutura

A segunda função já não é tão intuitiva, mas é de extrema importância. Os contraventamentos fazem um papel importantíssimo na estabilização das peças.

Quando falamos estabilidade, entenda que estamos nos referindo ao oposto de instabilidade que para nós é o mesmo que se conhece popularmente por “flambagem”.

Os contraventamentos ditam os comprimentos de flambagem das barras de uma estrutura. Vamos a uma exemplo gráfico para melhor visualização:

O sistema aporticado acima, não possui nenhum contraventamento. É fácil deduzir intuitivamente que qualquer perturbação, ou instabilização dos pilares pode levar a peça a um deslocamento progressivo do topo do pilar de forma que a estrutura, gerando efeitos de segunda ordem bastante acentuados, e que as vigas dos pavimentos não são capazes de criar nenhum tipo de conteção à flambagem dos pilares caso eles “decidam” flambar para o mesmo lado ao mesmo tempo.

Ao adicionarmos contraventamentos nos planos mais externos, o comprimento de flambagem de todos os pilares passam a acompanhar a grande rigidez desses nós no final de cada contraventamento, que trabalham sob regime de tração. Veja que mesmo o pilar do meio é obrigado a acompanhar o contravementamento dos extremos pois se ele “tentar” fazer uma curvatura completa, vai tracionar uma viga, que vai tracionar outra que por fim vai chegar até um nó rígido e vai parar por ali. No caso acima contraventamos a cada 2 pavimentos, de forma que podemos considerar o comprimento de flambagem dos pilares igual a exata distância entre dois nós de contraventamento. O Exemplo abaixo vai ilustrar ainda melhor.

Na configuração acima, os dois pavimentos inferiores receberam rigidez em seus nós através dos contraventamentos, tornando o comprimento de flambagem dos pilares desses pavimentos igual a distancia entre pisos, ao passo que os dois pavimentos superiores, os nós rígidos estão mais distantes, tornando a viga que não recebe nenhum contraventamento sem efeito de travamento, pois se um pilar vizinho “decidir flambar” ao mesmo tempo que ela e na mesma direção, ela será carregada lateralmente sem oferecer qualquer rigidez que possa ser considerada eficiente. Por isso nesse trecho o comprimento de flambagem desses pilares é igual a duas vezes o comprimento dos trechos inferiores.

Se você conhece o cálculo de barras comprimidas, deve saber que reduzir o comprimento de flambagem pela metade, gera um aumento de estabilidade muito grande, proporcional ao quadrado da redução, então, com certeza vale a pena estabilizar estruturas assim.

É por isso que você vê coberturas metálicas onde os contraventamentos são em todas as terças, e outros que pulam terças… aquilo é definido na hora do cálculo da resistência à compressão dos banzos superiores. Definimos qual o comprimento de flambagem ideal para o banzo que desejamos usar, e contraventamos apenas o que é necessário. Se contraventamos todas as terças, cada terça pode ser considerada como um ponto de travamento. Se pulamos uma terça a cada contraventamento, consideramos o comprimento de flambagem no plano da cobertura igual a duas vezes a distância entre terças e assim por diante.

Entendeu? Então, se você usa CYpecad Metalicas 3D, fique esperto, pois esses parâmetros não são padrão, e você precisa colocar manualmente os comprimentos de flambagem, seguindo as regras corretas.

Caso você queira saber mais sobre esse assunto, sugiro consultar a norma NBR8800/08 no item 4.11.1.2 e se aprofundar nos conceitos de contenções relativas e contenções nodais.

Depois de ler tudo isso, fica fácil entender que não podemos menosprezar os contraventamentos em estruturas de aço, na verdade eles são a principal ferramenta de um calculista que pretende ganhar reputação por produzir projetos leves e seguros.

É isso espero que tenha ajudado. Não esgotamos o assunto de maneira nenhuma, mas o que está escrito aqui nesse artigo já vai ajudar muita gente a enteder o suficiente para não errar nesses aspectos.

Se ficou alguma dúvida, lance nos comentários, grande abraço a todos, e não se esqueça de conhecer o curso de projeto e cálculo de estruturas de aço clicando no link abaixo